Ocultas palavras.


As palavras têm muita valia. Sim, sim, disso nunca duvidei e nem será neste texto que irei discordar. Mas o que poucas vezes paramos para pensar é como faltam palavras no nosso mundo, faltam verbos, substantivos, advérbios capazes de descrever um momento especial, uma cena, uma cor, uma dor, um sorriso, que estão ali, na nossa frente, mas que empacam na hora de passar ao papel, procura-se num dicionário, em outro, busca-se na mente, que para isso serve, mas a palavra não vem, ou talvez não exista, e o poeta, romancista ou seja lá o que for, frustra-se, envergonha-se, como se aquilo fosse unicamente uma falha dele, escritor, que não tem vocábulos suficientes para descrever algo tão simples, tão visível, quase palpável.

Mas infelizmente é assim, as palavras têm disso, brincam, divertem-se às nossas custas, como se depois de causarem seus estragos, nem sempre pequenos, tivessem um momento só delas, palavras, em que se juntam todas numa sala bem grande somente para fofocar sobre as confusões que causaram na vida de nós, pobres humanos, escravos das suas boas vontades. Devem passar horas rido-se da gente, fofocando sobre aquele casal que brigou por causa de uma só palavra, dita pelo marido quando já estava quase se indo, "Mentirosa!", e a confusão se alastrou. Ou divertindo-se com aquele repórter que, no principal telejornal do país, viu, sorrateiramente e perante milhões de telespectadores, uma certa palavra escorregar e desaparecer do seu já preparado e memorizado texto.

Agora, por exemplo, eu daria tudo para encontrar, se é que ele existe, e se existe já está provavelmente rindo de mim, o vocábulo correto, específico, completo, que me tranquilizasse a mente dizendo-lhe, "Acalma-te, isso não passa do sentimento tal". Mas ele não vem, eu poderia passar horas e dias e meses à sua espera que ele não se apresentaria. Assim, contento-me com a palavra que para nós existe. Saudade. Embora aperte, machuque bem mais do que esse vocábulo chega a designar. Quem não tem mais o que dizer, contenta-se com a saudade mesmo.


Frase do dia:
"O poema empaca. O poeta adormece
De chatice...
A vida continua, indiferente."
Mário Quintana

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