Atitude de primeira classe


Não sou muito de me emocionar com as coisas que acontecem no mundo. Não que eu seja um cara insensível, nada disso. O que acontece é que as notícias me soam tão iguais que o Jornal Nacional chega a parecer até novela mexicana, tamanha previsibilidade (na verdade, com todo o respeito à Fátima Bernardes e seu tradicional "boa noite", acho que até prefiro aquela típica novelinha mal dublada; pelo menos não se vê tanta desgraça, e o final é bem feliz).

Mas o certo é que um dia desses li algo que sinceramente me tocou. Aconteceu num voo da TAM. Devo admitir, antes de mais nada, que na realidade nem sei se o fato aconteceu mesmo – li a história no Facebook como um simples relato de alguém, de modo que a notícia, pra utilizar uma expressão bem formal, carece de fontes.

Mas vamos ao fato, potencialmente verídico. Uma mulher, ao entrar na aeronave e encontrar a poltrona que lhe fora destinada, se viu incomodada com uma situação (calma, caro leitor, ainda falarei que bendita situação era essa) e decidiu por bem chamar a aeromoça, antes mesmo de se sentar. Chegando então a tradicional, prestativa e bem vestida funcionária da companhia aérea, a passageira lhe disse que se recusava a sentar na poltrona que lhe estava reservada, já que no assento ao lado já estava acomodado um negro (isso mesmo, um negro, sem mais qualificações, palavras da tal senhora). A aeromoça, então, vendo-se embaraçada pela situação, pediu licença para tratar do assunto e se retirou. Ao voltar, a funcionária (imaginemo-la como sendo bem bonita, amigo leitor; prefiro imaginar essa cena com a aeromoça linda, impecável: como naquele tempo em que só havia belas aeromoças), a funcionária, como eu estava dizendo, falou que, embora esta não fosse uma política da TAM, o comandante havia aberto uma exceção, já que de fato seria muito incômodo passar uma viagem inteira ao lado de uma pessoa tão desagradável. Ainda havia, segundo informou a (linda, imaginemo-la linda!) comissária de bordo, uma vaga livre na primeira classe do avião. Em seguida, dirigiu-se pela primeira vez ao negro, que permanecera sentado durante todo o desenrolar da história, e lhe disse: "Assim, se for da sua vontade, o senhor pode pegar sua bagagem de mão e me acompanhar: teremos todo o prazer em lhe conceder essa poltrona na primeira classe." Todas as pessoas ao redor, segundo conta a versão que li, aplaudiram, grande parte de pé, o desfecho da cena, que àquela altura já chamara bastante atenção.

Eu, se estivesse na aeronave, além de me levantar e participar da salva de palmas, sentiria uma pontada de esperança lá no fundo do peito me dizendo que - talvez, mas só talvez - o mundo, com atitudes assim, ainda tenha algum jeito.


Frase do dia:
"Branco, se você soubesse o valor que o preto tem
Tu tomava um banho de piche, branco, e ficava preto também."
Paulinho Camafeu (O Rappa)

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