Nosso descompassado ser
Dizem que sou uma pessoa calma, serena, pacífica, e acabo por não ter como negar: de fato, pareço calmo, sereno, pacífico. Esse é o meu parecer. Se falo, c ostumo procurar as palavras mais moderadas, menos agressivas, fujo dos olhares agudos, das exclamações cheias de vida, das opiniões mais radicais. Opto quase sempre por caminhos que tenham uma cor morta – bege? – equilibrada e contida. De tanto parecer assim, as pessoas acabam por não ter dúvidas: olha lá o bege passando. Mas as pessoas, que culpa elas têm, afinal? Como poderiam inferir outro conceito de mim senão esse? Se elas só têm acesso, ou melhor, se eu só lhes dou acesso a essa parcela de minha realidade, como posso eu me queixar de ser isso a seus olhos? Ora, a nossa essência é uma instância para sempre perdida e nós, queiramos ou não, acabamos sendo apenas aquilo que... parecemos ser. Que me entendam: quando digo que somos aquilo que parecemos ser, não me refiro apenas à...