Vai-se morrendo
De súbito, a vontade de fugir da cidade; dos carros e mais carros que - feito dentes que visivelmente não cabem mais numa mesma boca - se apertam, rangentes, cada qual em busca de um espaço que já não há. A vontade - repentinamente louca, mas loucamente esclarecida - de fugir desse arranjo desarmônico, que cansa; cansa e mata, no fim das contas. Morrer de câncer, dengue, infarto, carro, moto, bala, cirrose? Não senhor. Que se diga isso num atestado de óbito, até vai. Mas tem uma luz que alumiará um letreiro pequenininho, presente em cada uma de nossas lápides, quando não mais estivermos por aqui. E o letreiro dirá que aí, nesse caos que alavanca(?) as grandes cidades, morre-se mesmo é desse bombardeio de informações que nos empurram goela abaixo. Ou melhor, não se morre; vai-se morrendo (se é que me faço entender a distinção entre as duas sentenças). Vai-se morrendo imperceptível e dosadamente, dia após dia, todos massacrados por essa infinidade de buzina, trânsito, fila, banco, outdo...