Além do bem e do mal.
Tinha tempos que eu procurava, ou melhor, não procurava exatamente, mas lamentava a falta de alguém que escrevesse crônicas do modo como gosto, do modo como intento escrever, ou, como disse - eu acho - Clarice Lispector, do modo que mais me toca, já que, segundo ela, um livro não é bom ou ruim. A questão é se ele lhe toca ou não, e o fato de possivelmente não lhe tocar não implica a conclusão de que seja ruim. Ele só não lhe tangencia, não lhe atinge, seu santo não bate com o dele, mas provavelmente bate com o de alguém por aí, ora. A propósito, por falar em bom e ruim, acho que já passou da hora de deixarmos essa bobagem de rotular tudo e todos com esses dois adjetivos tão sem profundidade, tão limitados. Me desculpem, mas essa foi, a meu ver, uma das lamentáveis heranças implicitamente deixadas pela Igreja (e não estou a afirmar que não houve também gratas heranças). Sim, sim, pela Igreja. Isso de ser, sem mais rodeios, bom ou ruim, sem outra opção. Ou é pecado ou não é. Ou é de Deus ou é do Diabo. Ou é certo ou é errado. Ou vai pro céu (que homem bom!) ou vai pro inferno (infeliz!). Não me atraem esses extremos. It's not so simple. Nem tudo, a meu ver, deveria ser tão ingenuamente rotulado, etiquetado, como se as nossas opções na vida fossem todas produtos de supermercado. Nossa vida, as escolhas que fazemos e os caminhos que tomamos são coisas que pra mim estão - mas também entendo plenamente se você preferir continuar com os práticos rótulos de bom e ruim - Além do bem e do mal, obra de Nietzsche que me abriu essa perspectiva, digamos, um pouco mais ampla.
Mas que coisa. Novamente comecei o texto pra falar de um assunto (o fato de ter enfim encontrado uma cronista a meu gosto) e terminei tratando de outro absolutamente desconexo. Me desculpo então pela falta de linearidade, mas ao menos finalizo com o nome da autora que, boa ou ruim, me mostrou novamente crônicas incrivelmente simples, sensíveis e bem-humoradas. Martha Medeiros, na obra Montanha Russa.
Frase do dia:
"O bem é uma boca, o mal é outra boca. Da saliva desse beijo sai a nossa alma."
Trecho de uma música de Dado Villa-Lobos, Gustavo Dreher e Fausto Fawcett.
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