Princípio de Locard.


Estava eu lendo um típico romance policial, daqueles que conseguem lhe prender a atenção do começo ao fim, quando o autor citou algo que me chamou muito a atenção, e olhe que definitivamente não é de um romance policial - sem desmerecer o gênero, que acho simplesmente fantástico - que eu espero frases das quais possa extrair algo para uma crônica como esta.

O autor falou sobre o Princípio de Locard, que eu fui conferir e de fato existe, sendo considerado inclusive o princípio básico no qual a ciência forense se baseia. Segundo a tal ideia, que, como todo princípio, se baseia em um pensamento simples mas de grande profundidade, todo contato deixa uma marca. Portanto, todo criminoso, por mais hábil que seja, ao entrar em contato com a vítima, seguramente deixará nela algum rastro, porque é assim mesmo que funciona: quando duas pessoas se tocam, sem dúvida elas trocarão entre si alguma coisa. Suor, células da pele, impressões digitais, saliva, sêmen, sangue, pedaços invisíveis do tecido da roupa e muito mais. Li isso e, por alguns minutos, me vi levemente embevecido por essa ideia, isso porque eu já vinha - embora não exatamente nesses termos - pensando nos últimos tempos sobre isso.

E disse "não exatamente nesses termos" porque, a bem da verdade, eu vinha imaginando que, quando duas pessoas se encontram (e não necessariamente se tocam), há uma troca, sim. No entanto, ao contrário de Locard, vinha construindo a ideia de que, no encontro entre esses dois corpos, cada um deles carrega do outro não a saliva, um fio de cabelo ou umas células da pele, mas sim uma impressão. Uma energia.

Só pra dar um exemplo: você já parou pra pensar naquelas pessoas que mal a gente conhece e logo simpatiza? Parece que o seu santo bate com o que está do lado de lá (e não estou falando de atração sexual, não é isso). Você não sabe rigorosamente nada sobre a pessoa, mas ela lhe é estranhamente familiar. Um tanto íntima, para dois desconhecidos. Tem gente que chama de química. Pra mim é energia. Energia, no caso, sintonizada.

E detalhe: não dá pra definir e generalizar a tal vibração, tanto que às vezes você olha pro seu amigo e diz, “Aquele colega do João parece ser muito gente boa, né?” E aí seu amigo responde, “Pois achei ele um porre”, quando na verdade o cara mal teve tempo de dar um oi, nem pra um, nem pra outro.

Mas dei esse exemplo com dois desconhecidos só pra ilustrar, pois na verdade acho que essa troca de vibrações acontece em todo contato humano. Quando você vê alguém, quando você fala com alguém - seja ele desconhecido ou o amor da sua vida -, tem algo, lá nas entrelinhas, que você está transmitindo, sutilmente. Quase involuntário. Como uma onda (elétrica?, magnética?) que seu corpo, seus gestos, sua fala e você inteiro expelem, atingindo o outro, que absorve.

Em suma, diria que o Princípio de Locard faz todo o sentido. A qualquer contato entre duas pessoas, uma troca. Mas não só de impressões digitais e cia., senhor Locard.


Frase do dia:
"Um bar legal precisa apresentar cinco qualidades fundamentais: boa circulação de ar, bom proprietário, bons garçons, bons fregueses e boa bebida. Isto é raríssimo de acontecer. Quando o garçom é uma flor de sujeito, o dono do bar costuma ser uma besta; se os fregueses são alcoólicos esclarecidos, o ambiente às vezes é quente e abafado; vai ver um excelente e confortável bar refrigerado, e boa porcentagem de uísque é fabricada no Engenho de Dentro. Para dizer toda a verdade, o bar perfeito não existe."
Paulo Mendes Campos

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